terça-feira, 31 de maio de 2011

Qualificação é alternativa contra desemprego causado pela mecanização


Estimativas da Pastoral do Migrante apontam que 50 mil trabalhadores deixam o Vale do Jequitinhonha anualmente para a safra da cana em São Paulo. Muitos enfrentam condições subumanas de trabalho, mas o fim da colheita manual, exigido por decreto federal, traz, por outro lado, a ameaça do desemprego.

O coordenador do setor de migração temporária da Pastoral do Migrante, José Carlos Alves Pereira, argumenta que a mecanização do corte de cana já surte efeito sobre o trabalho na região. Em 2005, segundo ele, eram 100 mil trabalhadores nessa atividade. No entanto, o fim da atividade não será súbito. "Na região de Ribeirão Preto, em São Paulo, o mecanização está prevista para até 2014. Mas os trabalhadores estão indo para outros estados e outras regiões", afirma. Ele cita dados, atribuídos ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que apontam para a dispensa de 150 mil cortadores de cana até 2014, 30 mil deles originados de zonas rurais dos municípios do Médio Jequitinhonha.


Esse quadro leva entidades que apoiam esses trabalhadores a reivindicar investimentos na agricultura familiar, para que o cortador de cana tenha opções de geração e renda em sua própria região. José Carlos lista necessidades como água potável e para o plantio, recursos, capacitação, educação, saúde e lazer como essenciais para o desenvolvimento dessa agricultura. Ele lembra ainda que a média de escolaridade do cortador de cana no Brasil é de 3,2 anos, e que esse trabalhador não consegue se inserir em outra atividade.

Na fase de debates, moradores também enfatizaram o problema da falta de água e compararam o Vale do Jequitinhonha com algumas regiões do Nordeste, que têm produtos agrícolas para a exportação, em função de terem água para o plantio.



PESQUISADORA DEFENDE DIAGNÓSTICO

Claudilene da Costa Ramalho, professora do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), defende que seja feito um diagnóstico profundo da situação para orientar as políticas públicas. "Foi preciso chegar a mecanização para esse problema ser discutido", criticou.

Segundo ela, os trabalhadores migrantes têm que cortar, em média, dez toneladas de cana por dia. Caso contrário, são devolvidos à região, onde geralmente chegam com problemas sérios de saúde e encontram as mulheres deprimidas pela solidão e pela sobrecarga de trabalho.

O assessor da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg), Rômulo Luiz Campos, afirmou que cada máquina de colher cana desemprega 115 trabalhadores e que o processo de mecanização ocorrerá também no café e no eucalipto. Ele disse desconfiar da motivação ambiental e cobrou a proteção aos trabalhadores prometida pelos governos, quando da edição da norma pelo fim da queima de cana. Rômulo sugeriu a criação de um órgão que centralize a contratação desse migrantes para garantir condições de trabalho.

A diretora-suplente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Virgem da Lapa, Maria das Graças Teixeira Santos, também relatou a situação dos cortadores e de suas famílias. "Só quem vive sabe o que é", definiu.

PREFEITOS

Vários prefeitos citaram experiências de cortadores de cana de seus municípios e a dificuldade de inserção desses trabalhadores em outra atividade. Eles solicitaram ações com resultados rápidos, sobretudo para garantir água às famílias que vivem no campo e para desenvolver a agricultura. Alguns também citaram o decreto do fim da mecanização como uma oportunidade de desenvolvimento das regiões do Vale, já que muitos municípios ainda tem na atividade do corte temporário de cana a principal fonte de renda de seus habitantes.

A atração que São Paulo exerce sobre os trabalhadores, a chance que esse emprego, quando formal, dá de comprar uma moto e de ter o seguro desemprego também foram mencionadas por prefeitos. São benefícios que as atividades incentivadas no Vale, como o artesanato, não oferecem facilmente. Daí a opção dos moradores pela migração.


REPRESENTANTES DO GOVERNO

O superintendente de Formação Profissional da Secretaria do Trabalho e Emprego de Minas Gerais, Agnos Rodrigues, colocou a secretaria à disposição para pensar um plano estratégico de qualificação dos trabalhadores do Jequitinhonha.

Ele lamentou que até mesmo o Sistema Nacional de Emprego (Sine) faça encaminhamentos de trabalhadores para o corte de cana, mas argumentou que esses cortadores, pelo menos, saem do Vale com um contrato, com a carteira assinada e com a certeza de que não serão escravizados. De janeiro até o início de maio de 2011, quatro mil cortadores de cidades do Médio Jequitinhonha foram encaminhados pelo Sine, sendo 90% deles para São Paulo.

Já o diretor-geral do Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas Gerais (Idene), Rúbio de Andrade, citou ações do governo, entre elas o Plano de Combate à Pobreza Rural, que destinará, neste ano, R$ 20 milhões para projetos em áreas rurais. Segundo ele, o governador Antonio Anastasia também determinou, há 15 dias, que cada órgão e entidade do governo apresente pelo menos cinco projetos relevantes, nas diversas áreas, para os Vales do Jequitinhonha e do Mucuri e o Norte de Minas.

DEPUTADOS COBRAM ARTICULAÇÃO DOS PODERES

O presidente da Comissão de Participação Popular e autor do requerimento para a audiência, deputado André Quintão (PT), salientou que a mecanização, que traz preocupação social, já que é a fonte de renda de milhares de pessoas, pode ser também uma oportunidade. "Será preciso desenvolver estratégias de desenvolvimento econômico sustentável para criar oportunidade de emprego e renda aqui na região. Desde agora estamos convocando poderes públicos e segmentos econômicos para que não cheguemos em 2014 com uma explosão de desemprego", afirmou. Ao final da reunião, ele ponderou que falta articulação entre os poderes e uma estratégia articulada para a região.

A deputada Rosângela Reis (PV), presidente da Comissão do Trabalho, prometeu empenho para fazer um diagnóstico do problema e buscar soluções. "A comissão tem buscado alternativas para as dificuldades dos trabalhadores, para qualificar, para dar condição de inserção no mercado de trabalho. Essa é uma luta suprapartidária", afirmou. Rosângela também destacou que nunca se ouviu falar tanto em Jequitinhonha como nessa Legislatura da ALMG. "Que possamos dar essa condição para que a população de Minas possa viver de maneira tranquila e com qualidade de vida", completou.

O deputado Luiz Henrique (PSDB) citou ações desenvolvidas na Assembleia e também a agenda política do governo que, segundo ele, tem priorizado o Jequitinhonha/Mucuri e o Norte. "De cada R$ 3 investidos pelo governo, R$ 2 são para essa região", afirmou.

O deputado citou ainda a transformação da Sedvan, de secretaria extraordinária voltada para a região para uma secretaria definitiva, e a criação da Subsecretaria de Agricultura Familiar. Ele anunciou ainda que apresentará um projeto de criação de um fundo para o desenvolvimento regional. "Agora vamos ter exploração de minério de ferro e precisamos exigir a construção de um modal ferroviário", afirmou.

FONTE

Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais
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