Publicado na Gazeta do Povo
Os temas discutidos nas eleições municipais deste ano serão os de sempre: educação, saúde, segurança pública e transporte coletivo. Certamente o discurso dos candidatos vai também abordar o desenvolvimento econômico. Disciplina fiscal, atração de investimentos privados, necessidade de repasses públicos entrarão na discussão. Entretanto, quando se trata de desenvolvimento regional, é um equívoco analisar a questão apenas sob esse prisma.
O crescimento econômico regional depende em grande parte da escolha geográfica dos indivíduos criativos. Essa é a visão do pesquisador Richard Florida, que propõem na obra A ascensão da classe criativa, que “o crescimento econômico regional é impulsionado por pessoas criativas, que preferem lugares diversificados, tolerantes e abertos a novas ideias”.
O chamado “capital criativo”, segundo Florida, é crucial para o desenvolvimento econômico. Entre os ramos que integram o núcleo da economia criativa estão a indústria do desenvolvimento de software, arquitetura e engenharia, mercado editorial e mídia, rádio e TV, brinquedos e jogos eletrônicos, propaganda, educação, design, moda e arte. Como indivíduos criativos são um recurso escasso e como eles tendem a procurar locais atrativos para morar, para conseguir alavancar o desenvolvimento regional, as cidades precisam criar meios de trazê-los para trabalhar na economia criativa local. E como fazer isso?
De acordo com Florida, as cidades precisam reunir três fatores: tecnologia, talento e tolerância. A região precisa ter uma base tecnológica mínima– seja decorrente de polo industrial, de tecnologia da informação, ou de centros de pesquisa de universidades. Mas precisa também ser tolerante e aberta para a diversidade de ideias, pensamentos ou estilos de vida. “A diversidade aumenta o potencial do lugar atrair indivíduos criativos, com ideias e habilidades distintas”, explica o pesquisador. Quando as cidades propiciam elevada concentração de troca de diferentes ideias, quando possibilitam que indivíduos criativos se encontrem e compartilhem experiências, aumenta a propensão de surgir inovação, negócios de alta tecnologia, novas manifestações culturais, ampliando as possibilidades de geração de empregos e crescimento econômico.
Para que as cidades criem ambientes estimulantes ao convívio da diversidade, os dirigentes políticos precisam investir no que Florida chama de “qualidade de lugar”. Em contraposição ao conceito de qualidade de vida, a “qualidade de lugar” é o conjunto de características que tornam uma cidade atraente – a combinação entre a paisagem natural e o ambiente construído; a diversidade e a tolerância da população, ou seja, a sua propensão a aceitar novos membros na comunidade; a vida ao ar livre nas ruas e praças; a cultura de cafés, esportes, artes e música. Esses elementos permitem o convívio e a interação criativa.
Como as prefeituras desempenham um papel essencial na transformação da paisagem das cidades, elas podem fazer muito para melhorar a “qualidade de lugar”. De fato, é uma de suas obrigações. Um bom começo seria ter a melhoria da “qualidade de lugar” como princípio orientador da gestão de seus recursos financeiros. Florida dá um exemplo elucidativo sobre como as decisões políticas na alocação de recursos afetam a qualidade de vida: “costumo dizer aos líderes das cidades que encontrar meios de incentivar a cena musical local pode ser tão importante quanto investir em negócios de alta tecnologia e bem mais eficaz do que construir um shopping no centro da cidade”.
O que o pesquisador quer dizer é que ao estimular o desenvolvimento de nichos culturais em uma cidade, as autoridades estão fazendo muito mais que isso. A interação de pessoas nesses espaços pode trazer benefícios – inclusive econômicos – que não eram previstos inicialmente. Já o estímulo à criação de um shopping não tende a produzir o mesmo efeito, porque em regra não estimula a criatividade, nem a interação, mas tão somente o consumo. Em síntese, a abertura de shoppings e estímulo de artes são questões de política e estratégia econômica.
É improvável que a qualidade de lugar vá render um debate qualificado dos candidatos a prefeito deste ano. Como os seus efeitos não são facilmente perceptíveis, o investimento tem pouco alcance como garantidor de votos. Entretanto, embora a qualidade de lugar não seja um bom discurso para a vitória nas urnas, ela deveria ser seriamente encarada como opção estratégica para o desenvolvimento regional. Porque, como ela dá vantagem competitiva em relação aos demais concorrentes, se uma cidade não utilizar esse conceito como parte de seu planejamento estratégico, e outras usarem, já se pode prever quem irá ter melhores condições de prosperar.
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